sábado, 28 de janeiro de 2012

A PRIVATARIA TUCANA E A DOUTRINA DO CHOQUE


     Li  A Privataria Tucana (de Amaury Ribeiro Jr.), com o interesse de um professor e, antes de tudo, cidadão. Uma sinopse pode ser encontrada em


     Para mim, o que mais o livro tem de interessante é, sem dúvida, o projeto neoliberal de privatização de empresas estatais, de desregulamentação do Estado e o fim do Estado de bem-estar social defendido por poderosos setores da economia e da política no Brasil.

     Li também o livro de Naomi Klein, A Doutrina do Choque. A principal tese da autora, estampada no subtítulo do livro, é a ascensão do capitalismo de desastre.

     O texto compara o tratamento de choque usado por pacientes nas clínicas psiquiátricas dos EUA durante a Guerra Fria com os planos neoliberais da Escola de Chicago, cujo nome fundamental é Milton Friedman.

     A autora defende que catástrofes naturais (furacão, tsunami, terremoto) ou catástrofes político-militares (golpe de Estado no Irã, contra Mohammad Mossadegh, na Indonésia, contra Achmed Sukarno, no Chile, contra Allende), funcionam nas sociedades como o tratamento de choque nos indivíduos: surge um vazio, um pavor, uma angústia, um “papel em branco” nas mentes.

     A retração da economia brasileira, iniciada no governo Dilma, e o golpe em andamento, iniciado em 2016, alimentam os setores nacionais e internacionais para a implantação de um modelo que implique a desnacionalização da economia e a retirada de direitos trabalhistas e sociais.

     Esse é o terreno considerado ideal para os defensores do neoliberalismo implantarem a receita de Friedman e da Escola de Chicago.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

SOMOS TODOS FILHOS DA MESMA MÃE


Em 09/01/2003, foi aprovada a Lei 10.639, que determina: “Nos estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira”. E ainda “O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra.”

 

Visão de Padre Vieira

“Oh, se a gente preta tirada das brenhas da sua Etiópia, e passada ao Brasil, conhecera bem quanto deve a Deus e a Sua Santíssima Mãe por este que pode parecer desterro, cativeiro e desgraça, e não é senão milagre, e grande milagre!”

(VIEIRA, Padre Antônio. Sermão XIV)

 Mais Padre Vieira

Não há trabalho, nem gênero de vida no mundo mais parecido à cruz e paixão de Cristo, que o vosso em um desses engenhos. Em um engenho sois imitadores de Cristo crucificado [...] Cristo sem comer, e vós famintos; Cristo em tudo maltratado, e vós maltratados em tudo. Os ferros, as prisões, os açoites, as chagas, os nomes afrontosos, de tudo isso se compõe a vossa imitação, que se for acompanhada de paciência, também terá merecimento de martírio”.

 (VIEIRA. Sermões. Apud BOSI, Alfredo. A dialética da Colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p. 172.)

 

Visão de Hegel

“A África não é uma parte histórica do mundo, não oferece nenhum movimento, desenvolvimento ou progresso próprio. (…) O que entendemos propriamente por África é o espírito sem história, o espírito ainda não desenvolvido, envolto nas condições naturais.” (Hegel, 1830)

 

ALGUMAS RESPOSTAS À IGNORÂNCIA:


 “O Brasil é um país extraordinariamente africanizado. E só a quem não conhece a África pode escapar o quanto há de africano nos gestos, nas maneiras de ser e de viver e no sentimento estético do brasileiro (…)

 O escravo ficou dentro de nós, qualquer que seja nossa origem(…)

 Com  ou sem remorsos, a escravidão é o processo mais longo e mais importante de nossa história”.

 (COSTA E SILVA, A. O Brasil, a África e o Atlântico no Século XIX)


Você pode me riscar da História
Com mentiras lançadas ao ar.
Pode me jogar contra o chão de terra,
Mas, ainda assim, como poeira,
Eu vou me levantar.

Minha presença o incomoda?
Por que meu brilho o intimida?
Porque eu caminho como quem possui
Riquezas dignas do grego Midas.
Como a Lua e como o Sol no céu,
Com a certeza da onda do mar,
Como a esperança emergindo da desgraça,
Assim eu vou me levantar.

Você não queria me ver quebrada?
Cabeça curvada e olhos para o chão?
Ombros caídos como lágrimas,
Minha alma enfraquecida pela solidão?
Meu orgulho o ofende?
Tenho certeza que sim,
Porque eu rio como quem possui
Ouros escondidos em mim.
Pode me atirar palavras afiadas,
Dilacerar-me com seu olhar,
Você pode me matar em nome do ódio.
Mas, ainda assim, como o ar,
Eu vou me levantar.

Minha sensualidade incomoda?
Será que você pergunta
Por que eu danço como se tivesse
Um diamante onde as coxas se juntam?

Da favela, da humilhação imposta pela cor
Eu me levanto.

De um passado enraizado na dor
Eu me levanto.

Sou um oceano negro, profundo na fé,
Crescendo e expandindo-se como a maré.
Deixando para trás noites e terror e atrocidade,
Eu me levanto

Em direção a um novo dia de intensa claridade
Eu me levanto
Trazendo comigo o dom de meus antepassados,
Eu carrego o sonho e a esperança do homem escravizado.
E assim, eu me levanto
Eu me levanto
Eu me levanto.

(Maya Angelou, poetisa afro-americana)

 




Mãe
Por Mario Luiz

Mãe Negra que na Savana
Deu-me a luz entre os leões
Sob um rubro pôr-do-sol
Que nossa pele inflama.


Mãe Guerreira, protetora e gentil,
Olhai por teus filhos que sangram
Por entre tuas mãos trêmulas,
Submetidos à condição servil.


Mãe Natureza, selvagem e amável,
Aceitai-nos em teus braços.
Saciando a fome de almas esquecidas
E corpos miseráveis.


Mãe Africana, perdão, mamãe... perdão
Se para longe de ti me levaram,
E na terra de Vera Cruz me forçaram
A silenciar tua voz em meu coração.


Que as chibatadas que lambem minhas costas
Possam servir para despertar a força que plantaste em minh’alma.


Oiram Ziul


AS ÁFRICAS QUE COLOREM A CULTURA DO BRASIL


 “Depois de uma dura travessia pelo oceano Atlântico, os negros africanos foram obrigados a mudar sua maneira de viver, adaptando seus costumes e suas tradições ao novo ambiente. Misturando-se aos povos que aqui encontraram, esses negros deram origem à mestiçagem que amorenou a nossa pele, alongou nossa silhueta, encrespou nossos cabelos e nos conferiu a originalidade de gestos macios e andar requebrado. Ao incorporarem elementos africanos ao seu dia-a-dia nas lavouras, nos engenhos de açúcar, nas minas e nas cidades, construíram uma nova identidade e nos legaram o que hoje chamamos de cultura afro-brasileira.”



Fonte: trecho da Apresentação do livro África e Brasil Africano, de Marina de Mello e Souza, Editora Ática.


HERANÇA MUSICAL AFRICANA

O universo musical africano expandiu-se de tal modo que definiu os caminhos da música popular no mundo ocidental. A lista das tendências que se projetaram a partir dele na música popular norte-americana é interminável: jazz, rap, soul, gospel, funk, rock, pop, house, dance, spiritual... O mesmo pode ser dito da música popular na América Central e na América do Sul. O reggae jamaicano e a inesgotável reserva rítmica de Cuba, que lançou o mambo, a rumba, a salsa, a conga e a habanera.
No centro da música brasileira está o SAMBA. Sem falar no lundu, no maxixe, no baião, no afoxé, no carimbó...
As danças africanas se fazem numa mistura de sons, canções, batuques, ritmos e movimentos tradicionais com um toque de cores, expressões, gingado, espontaneidade e sensualidade dos corpos em movimento rítmico harmonioso.
Marcos César de Oliveira Pinheiro

O PIONEIRISMO AFRICANO


Falar em história da África é falar sobre a história humana. Afinal, foi lá que surgiu o Homo sapiens, cerca de 160 mil anos atrás. Portanto, a humanidade desenvolveu-se primeiro no continente africano e, progressivamente e por levas sucessivas, foi povoando o planeta inteiro. De lá, partiram os habitantes que constituíram os primeiros núcleos urbanos na Europa mediterrânea, América, Ásia e Oceania.
Quando se pensa em civilização, também a África foi pioneira. A importância do continente no mundo antigo é hoje inegável. Sobretudo a partir da ascendência civilizatória milenar do Egito faraônico sob as civilizações que beiravam o Mediterrâneo: persa, assíria, hitita, cretense, helênica, hebraica e outras. Trata-se de uma história de 7 mil anos que formou a base sociocultural da maioria das civilizações na Antiguidade. A cultura egípcia teve importante influência para a expansão das artes, das ciências empíricas (matemática, geometria, biologia, astronomia etc.), da filosofia da natureza e do pensamento religioso.
Da África saíram, a partir do século XVI, levas de escravos que vieram para as Américas no período da escravidão e participaram da formação do Brasil.
No século XX, após longas lutas de independência, constituíram-se novas nações na África.
Com sua arte, cultura e tradições, os africanos influenciaram e continuam a influenciar o mundo.
Marcos César de Oliveira Pinheiro


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

PRIVATIZAÇÃO DA USP


Folha de S. Paulo
Uma campanha descarada pela privatização da USP
Colunista da Folha de S. Paulo, Hélio Schwartsman, analisa e defende a situação “inevitável da privatização da mais importante universidade brasileira

15 de fevereiro de 2011
A enorme rejeição popular diante da possibilidade de privatização da USP faz com que a burocracia universitária e o próprio governo evite defendê-la claramente. Neste momento, um dos porta-vozes da direita no estado de S. Paulo, o jornal Folha de S. Paulo, aos poucos coloca o tema de forma clara. O colunista Hélio Schwartsman inicia seu artigo afirmando “Do jeito que está ocorrendo, a chamada ´privatização da USP´ vem de forma atabalhoada e provavelmente ilegal.” (Falta ao país fazer o debate sobre a gratuidade do ensino superior público, Folha de S. Paulo, 14/2/2011).
A defesa da privatização aparece com a cobertura de que privatização já é uma realidade e nada mais pode ser feito. Schwartsman afirma em seu texto: “sem controles formais mais rígidos, é difícil até saber se a universidade recebe uma remuneração adequada por emprestar sua estrutura e marca a cursos que não se distinguem daqueles oferecidos pela iniciativa privada.” E chega no ponto principal que é a defesa da privatização da USP “São erros de procedimento que não desmerecem a discussão de fundo: a universidade pública deve ou não ser gratuita?” (idem)
Apesar de dizer que os dois lados têm bons argumentos, a gratuidade do ensino superior para ele é a seguinte: “Universidade gratuita é algo que contraria as leis da física e da economia.” (idem)
Finaliza afirmando que “A grande verdade é que, enquanto vários países já travaram esse debate e tomaram sua decisão, por aqui nós o estamos evitando - e apelando a gambiarras.”.
O autor reforça que a privatização já está sendo colocada em prática, mas de forma camuflada para evitar a revolta da comunidade universitária e popular.
É importante esclarecer que apesar do disfarce há uma evolução na política da privatização que já está sendo defendida abertamente. Além do significativo passo de o PSDB colocar Rodas como interventor na USP para adiantar este processo.
Está claro que a privatização da USP é a porta de entrada para acabar com o ensino superior público e gratuito no País.
Para reforçar a tese apresentada pelo colunista, foram publicadas mais duas matérias “15 mil alunos pagam por cursos da USP - Programas de especialização, oferecidos pelas faculdades dentro do campus, chegam a custar quase R$ 30 mil”, que se inicia com “"A Universidade de São Paulo (USP) é pública e gratuita", afirma o site oficial da instituição. Neste ano, porém, 15 mil matrículas uspianas (de um total de quase 114 mil) serão preenchidas por alunos pagantes.”; “Promotoria já atuou contra as cobranças”. Para tentar convencer e mostrar aos leitores que a estrutura para a privatização já está toda criada.
Mais do que em qualquer outro momento, a tarefa do movimento estudantil é defender a USP de todos os ataques promovido pelo reitor-interventor João Grandino Rodas e barrar a privatização.
http://www.pco.org.br/conoticias/ler_materia.php?mat=26604

23 de novembro de 2011 às 0:15

USP: Privatização e militarização

por Francisco Alambert, Francisco de Oliveira, Jorge Grespan, Lincoln Secco, Luiz Renato Martins e Marcos Soares, sugestão de Ricardo Maciel
da Folha de S. Paulo
As razões da militarização do campus da USP transcendem os limites e dados recentes a partir dos quais tem sido discutida. Por que não propor a mudança do teor ermo e rural do campus por sua urbanização efetiva, o aumento de cursos noturnos etc.?
Em vez disso, a reitoria traz coturnos, controles e revistas, rasantes de helicópteros, que rasgam o pensamento e a escuta (que atenção resiste à rotação das hélices?), e bombas; logo virão cães… Insiste em ações de respostas e sequelas imprevisíveis. Já se tem os vultos cauta e justamente encapuzados dos nossos estudantes contra a reitoria ditatorial e policialesca.
Por que a insistência no trauma, na indignidade, no modo custoso e descabido? A verdade é que a militarização, ou terceirização da segurança, deriva da privatização em curso da USP.
Combina-se ao sucateamento, no campus, do hospital, da moradia estudantil e do transporte, aos cursos pagos e escritórios externos. Com que fim? Recordemos.
O primeiro ato da gestão Serra foi criar a Secretaria de Ensino Superior, englobando as universidades estaduais e a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), com orçamento de grande estatal, superior ao de Estados.
O pacote privatista cindia pesquisa e ensino, sediava a pesquisa em ilhas, associando-a a empresas, substituía o ensino presencial por telecursos e submetia o todo a critérios empresariais.
Resultou em greves por todo o Estado, na primeira ocupação da reitoria da USP (maio-junho, 2007) e na demissão do secretário Pinotti.
O governo, porém, não desistiu. Passou a priorizar a liquidação do movimento que obstou o primeiro carro-chefe da campanha de Serra à Presidência. Fez a reitoria nomear um investigador de polícia como diretor de segurança da USP no final do ano de 2007.
Os furtos no campus seguiram, mas o alvo era outro: em 2008, a reitoria demitiu um dirigente sindical, apesar da imunidade constitucional do cargo, e implantou a estratégia de processos administrativos e penais seriais contra os sindicalistas e estudantes.
À rádio Bandeirantes, o reitor afirmou, em 2010, que a USP era como os “morros do Rio” e que requeria uma intervenção como a do Haiti. Hoje, cinco dirigentes sindicais encontram-se em vias de demissão, até por “crime de opinião”, e 25 estudantes, às portas da expulsão, com base em artigo que proíbe a difusão de ideias políticas no campus; com as prisões recentes dos 73, ascende a quase cem a lista dos estudantes perseguidos.
De fato, a USP, sem acesso universalizado — ao contrário de universidades públicas da Argentina e do México—, ainda não se pôs, como deve, a serviço da sociedade como um todo.
Está, no entanto, a sociedade ciente do processo em curso e disposta a prosseguir na dilapidação e cessão a grupos privados do enorme potencial da universidade?
O reitor Rodas acelera vertiginosamente a fratura social e política da USP. É preciso caminhar para uma estatuinte, sem o que não haverá concórdia e paz.
Os problemas da USP, inclusive os de malversação e de uso obscuro de bens, são em sua raiz políticos, e se reproduzem por um regimento herdado do autoritarismo, que fere toda ordem democrática.
Sua solução passa, como a do país, pelo sufrágio universal, pela abertura social, pela preservação da gratuidade, pela multiplicação de cursos noturnos e pelo incentivo a pesquisas em diálogo real com as necessidades nacionais.
Francisco Alambert é professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP).
Francisco de Oliveira é professor emérito da FFLCH-USP.
Jorge Grespan é professor da FFLCH-USP.
Lincoln Secco é professor da FFLCH-USP.
Luiz Renato Martins é professor da Escola de Comunicações e Artes da USP.
Marcos Soares é professor da FFLCH-USP.
http://www.viomundo.com.br/politica/usp-privatizacao-e-militarizacao.html

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

CONSERVATÓRIA , "CAPITAL MUNDIAL DA SERESTA"


Conservatória é uma pequena cidade no interior do Estado do Rio de Janeiro. Com certeza, irei conhecê-la pessoalmente. Meu interesse começou quando recebi um vídeo, mostrando serestas e serenatas entoadas por pessoas daquela cidade. O vídeo é um dos resultados da pesquisa de campo realizada pelos assistentes de pesquisa do Professor Micael Herschmann, da UFRJ, pesquisador e professor de Cultura Brasileira da Escola de Comunicação da UFRJ. O estudioso publicou, entre outras obras, O Funk e o Hip-Hop Invadem a Cena e é o organizador de outra obra, Nas Bordas e Fora do Mainstream Musical, uma coletânia de textos sobre as novas tendências da música independente neste início de século. O Professor Micael é autor de um dos textos dessa obra, justamente falando de Conservatória. Outro texto, Música e Sociabilidade: o samba e o choro nas ruas-galerias do centro do Rio de Janeiro, é de autoria de Cíntia SanMartin Fernandes, minha segunda filha de uma penca de cinco filhos pelos quais tenho orgulho de me pavonear.
Pesquisando via internet, aprendi que “As casas em Conservatória são  encontradas pelos carteiros não pelo número, mas por uma plaquinha com o nome de uma música. Quase todas são assim. Então você vai à rua das Flores na casa Chão de Estrelas ou na casa Luar de Paquetá, Saudosa Maloca, Maringá, Iracema, etc.”
Aprendi também que “Várias novelas de televisão foram gravadas em Conservatória: O Feijão e o Sonho, Escrava Isaura, Sinhá Moça, uma pequena parte de Cambalacho, Salomé e A Viagem.”
Aprendi ainda a diferença entre serenata e seresta. A serenata é nas ruas, sob as estrelas e a garoa, enquanto a seresta é em locais fechados. É muito bom aprender!

O público que lê meu blog é, acredito, majoritariamente jovem e estudante pré-vestibulando, pois é com esse público alvo que trabalho. Com certeza todos gostam de música, não importa de que música gostem mais. Pensando nesses jovens, alguns dos quais nunca tiveram acesso às serestas e serenatas, publico o link a mim enviado pelo Professor Micael.




quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

ONDE O BRASIL APRENDEU A LIBERDADE


Acabei de postar um texto resumindo as Revoltas Nativistas no Brasil. Já tinha publicado outro, sobre Pernambuco Rebelde. Nos dois, a luta contra os holandeses foi tratada como fundamental para a formação do sentimento nativista. Leiam como a arte trata do mesmo assunto. Abaixo, o link com a música, nas vozes de Martinho da Vila e Beth Carvalho.

Composição : Martinho da Vila
Aprendeu-se a liberdade
Combatendo em Guararapes
Entre flechas e tacapes
Facas, fuzis e canhões
Brasileiros irmanados
Sem senhores, sem senzala
E a Senhora dos Prazeres
Transformando pedra em bala
Bom Nassau já foi embora
Fez-se a revolução
E a festa da Pitomba é a reconstituição
Jangadas ao mar
Pra buscar lagosta
Pra levar pra festa
Em Jaboatão
Vamos preparar
Lindos mamulengos
Pra comemorar a libertação
E lá vem maracatu, bumba-meu-boi, vaquejada
Cantorias e fandangos
Maculelê, marujada
Cirandeiro, cirandeiro
Sua hora é chegada
Vem cantar esta ciranda
Pois a roda está formada
Cirandeiro
Cirandeiro, Ó
A pedra do seu anel
Brilha mais do que o sol

TENTATIVAS DE EMANCIPAÇÃO


Introdução

No século XVIII, o Antigo Regime e, dentro dele, o Sistema Colonial Mercantilista, passaram a ser abalados pelas novas forças de transformação que varreram o mundo atlântico, na Europa e nas colônias da Europa, no centro do sistema e na periferia. Estruturalmente, o capitalismo comercial transitava para o capitalismo industrial e a principal fonte de acumulação de capital passava da circulação (comércio) para a transformação (indústria).
A Inglaterra saiu na frente, consolidando sua burguesia industrial que questionava a continuidade de mercados enclausurados pelo regime de monopólios comerciais. A produção fabril, em larga escala, precisava de mercados abertos e amplos, o que era impossível com a manutenção do pacto colonial.
Nos quadros da crítica ao Antigo Regime, o Iluminismo condenava ideologicamente o  passado. Fundado na razão burguesa, apoiado no cientificismo do século XVII, os pensadores iluministas propunham o liberalismo, sintetizado política e socialmente por “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”, e pelo laissez-faire, a liberdade econômica. Ao peso da Revolução Industrial inglesa somou-se o peso da Revolução Francesa de 1789. O Antigo Regime desmoronou. Uma nova realidade pulsava na Europa e chegava irreversivelmente às suas colônias. O Atlântico não conseguiu barrar as novas ideologias que passaram a alimentar os movimentos rebeldes contra a própria dominação europeia.
Na América colonial, as treze colônias inglesas levantaram-se contra a Inglaterra e conseguiram romper os laços que as prendiam ao sistema dominador. A vitória dos colonos norte-americanos animou não só súditos de outras metrópoles, mas a própria burguesia francesa a se levantar contra o poder instituído.

No caso do Brasil colonial, pela ausência de uma burguesia, a liderança dos movimentos rebeldes era exercida, frequentemente - não exclusivamente - pela elite agrária, dona de terras e de escravos. Os ideais iluministas aqui chegados foram adaptados aos interesses dessa elite. A sonhada emancipação política, rompendo com a metrópole, não podia implicar a mudança das relações internas de dominação.
 Um exemplo disso foi a Inconfidência Mineira, durante a qual, em suas reuniões secretas, muitos inconfidentes eram contra a abolição da escravatura, por serem eles da elite. Diferente disso, a Conjuração Baiana, ou “dos Alfaiates”, tinha um caráter mais popular. A Inconfidência Mineira não foi diretamente influenciada pela Revolução Francesa, pois aquela ocorreu em abril e esta em julho de 1789. Contudo, o cenário era o mesmo, o da crítica ao Antigo Regime.
 Já a Conjuração do Rio de Janeiro, de 1794, a Conjuração Baiana, de 1798, a Conspiração dos Suassunas em Pernambuco, de 1801e a Revolução Pernambucana, de 1817, foram decisivamente influenciadas pela Revolução Francesa, de 1789.

Inconfidência Mineira, 1789

(Para melhor entender as revoltas em Minas Gerais, leia antes, neste blog, MINERAÇÃO NO BRASIL COLONIAL, clicando em PESQUISAR NESTE BLOG.)

Enquanto ocorria a decadência da mineração, pelo esgotamento das jazidas, Portugal criava novos impostos, tornando mais rígido o controle fiscal. Para os colonos, tratava-se de um abuso do fiscalismo metropolitano. Além disso, e cada vez mais, os colonos entraram em contato com as novas idéias vindas da Europa, pregando liberdade, fraternidade, igualdade, liberalismo econômico, democracia, república.
Os participantes da revolta eram, na maioria, letrados: José Joaquim Maia, estudante brasileiro na Europa que tentou apoio dos Estados Unidos ao entrevistar-se com Thomas Jefferson, em Paris; os poetas Cláudio Manuel da Costa, Inácio de Alvarenga Peixoto e Thomas Antônio Gonzaga; os doutores José Álvares Maciel, Domingos Vidal Barbosa e Salvador Amaral Gurgel; os padres Manuel Rodrigues da Costa, José Oliveira Rolim e Carlos de Toledo Piza e os militares Francisco de Paula Freire de Andrade e Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
Os planos dos inconfidentes revelam que estavam mais preocupados com o que fazer após a revolta e pouca preocupação em como fazer a revolta. Ou seja, poucos planos militares e muitos planos a serem realizados se a revolta sair vitoriosa. Entre tais planos, destacam-se: adoção de uma República para Minas Gerais (ou para todo o Brasil); transferência da capital para São João d’El Rei; construção de uma universidade em Vila Rica; industrialização; adoção de uma bandeira onde estaria estampado o dístico Libertas Quae Sera Tamem (Liberdade, ainda que tardia). 
Nem todos os inconfidentes concordaram com todos os planos, principalmente a respeito da abolição da escravatura. Os conjurados divergiam entre si e apresentaram grande idealismo e pouco preparo militar. O pretexto para o início da revolta seria a cobrança da derrama. Naquele momento, a dívida acumulada chegava a 596 arrobas de ouro, ou seja, quase 9 toneladas do precioso metal.
Na prática, o movimento não chegou a acontecer, pois foi delatado por Joaquim Silvério dos Reis, coronel português endividado, e pelos tenentes-coronéis Brito Malheiros e Correia Pamplona. A devassa foi posta em prática pelo Visconde de Barbacena, em nome da rainha de Portugal, D. Maria I.
O único condenado à morte, por enforcamento, foi Tiradentes, alferes do exército.

Sentença contra Tiradentes: “Portanto condenam o réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, alferes que foi do Regimento pago da Capitania de Minas, a que (..) seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca, e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, onde no lugar mais público dela, será pregada em um poste alto, até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes (...) onde o réu teve as suas infames práticas (...) até que o tempo também os consuma, declaram o réu infame, e seus filhos e netos (...) e a casa em que vivia em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados, e mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável réu; [...]

Nota: a imagem de Tiradentes foi resgatada e recriada após a proclamação da República, em 1889. Os republicanos buscaram um ícone que não fosse monarquista. Em muitas obras pictóricas, os autores lembraram a imagem de Jesus Cristo no retratado.

Conjuração Baiana ou dos Alfaiates, 1798
 (Também conhecida como Revolução dos Búzios)

O Nordeste já foi, na época do açúcar, o pólo econômico do Brasil. Salvador, na Bahia, era a capital. A capital política, que só devia obediência à metrópole, localizava-se, portanto, na região mais rica da colônia.
A crise da economia açucareira, (provocada pela produção nas Antilhas), o deslocamento do eixo econômico e demográfico para o Centro-Sul (graças à mineração), tornou-se mais aguda quando, em 1763, a capital do Brasil foi transportada para o Rio de Janeiro, dentro das reformas executadas por Pombal.
A decadência da Bahia, especialmente de Salvador, desembocou na pobreza e na miséria. Enquanto isso, aumentava o fiscalismo e a opressão metropolitanas. Contra tal situação, dois pequenos movimentos rebeldes ocorreram e foram rápida e violentamente abafados. Mas suas causas continuaram e explicam parcialmente a Conjuração dos Alfaiates.
O movimento foi conduzido pelos maçons da loja Cavaleiros da Luz, impregnados pelos ideais iluministas vindos da Europa. Adquiriu um caráter popular e social. Entre seus participantes destacaram-se os alfaiates João de Deus e Manuel Faustino dos Santos Lira, os soldados e mulatos Lucas Dantas e Luís Gonzaga das Virgens,  o médico Dr. Cipriano Barata, o tenente Hermógenes Francisco D’Aguiar, o maçon Francisco Barreto e o padre Agostinho Gomes.

A Revolução Francesa serviu de modelo para as suas realizações. Pregaram a República, a liberdade, a igualdade, a liberdade de comércio externo, a melhoria dos soldos dos militares, a abolição dos escravos e, com ela, a abolição dos preconceitos de cor.
Um dos cartazes produzidos e divulgados pelos rebeldes assim dizia: “Animai-vos, povo baiense, que está para chegar o tempo feliz de nossa liberdade: o tempo em que todos seremos irmãos, o tempo em que todos seremos iguais”.

Após denúncia, os conjurados foram presos. No processo, os intelectuais foram absolvidos ou degredados. Cinco líderes populares, todos negros,  foram condenados à forca. Um dos condenados havia fugido e jamais foi encontrado. Os corpos dos quatro executados foram esquartejados e suas partes espalhadas por lugares de maior trânsito de pessoas. 

O Movimento Negro considera heróis os quatro executados. Para alguns pesquisadores, como Afonso Ruy, em seu livro A Primeira Revolução Social do Brasil, a Conjuração foi mesmo, a primeira de caráter amplamente social. Se comparada à Inconfidência Mineira, não há a menor dúvida.




Conspiração dos Suassunas e Revolução Pernambucana de 1817, ver neste blog, clicando PERNAMBUCO REBELDE, em Pesquisar.


terça-feira, 10 de janeiro de 2012

REVOLTAS NATIVISTAS


Até a metade do século XVII, os colonos residentes no Brasil, inclusive os aqui nascidos, não faziam grande diferença entre eles próprios e os habitantes da metrópole. Ideologicamente, a única diferença entre eles e os da metrópole era de origem geográfica, tendo apenas um oceano a separá-los. É o fenômeno do transoceanismo, nos dizeres de Capistrano de Abreu: os colonos tinham os pés no Brasil e a cabeça em Portugal. Enquanto a produção açucareira, principal atividade colonial, dava lucro, a aristocracia rural e a política metropolitana estavam em harmonia. Os senhores de engenho, embora explorados pelo mercantilismo português, eram exploradores da massa escrava e detinham muitos privilégios. A maior parte do capital gerado pelo açúcar ia para a Holanda, então sócia de Portugal, que ficava com a segunda maior parte, deixando aos senhores de engenho uma parcela menor, mas capaz de garantir seu nível de elite dentro da colônia.
Nesses cento e cinquenta anos iniciais do Brasil português, as revoltas fundamentais eram as dos negros e dos índios contra a elite branca exploradora e escravocrata. Nasciam os primeiros quilombos.
A União Ibérica, iniciada em1580, e a Restauração portuguesa, de1640, começaram a mudar essa realidade das relações entre colonos e metropolitanos. A invasão holandesa, durante a União Ibérica, a luta para expulsar os invasores, o colapso da economia açucareira nordestina que se seguiu e a mudança da política mercantilista adotada pela dinastia de Bragança, que passou a ser mais centralizadora e mais opressora, alteraram a visão que os colonos tinham dos metropolitanos. Começaram e entender que a diferença entre eles e os reinóis não era apenas de ordem geográfica: os primeiros eram os explorados e os segundos os exploradores. Surgia e chamado sentimento nativista. A princípio, o nativismo era muito tímido e difuso, mas já serviu para embasar ideologicamente as primeiras revoltas, enquanto a crise econômica embasava materialmente as lutas coloniais.
Os movimentos nativistas foram isolados entre si, no tempo e no espaço. Não representaram ideais de independência, de ruptura com o sistema de exploração mercantilista luso. Não questionaram o regime de monopólio implícito no pacto colonial. Caracterizaram-se pela oposição a uma determinada pressão econômica, pressão fiscal, geradas pelo enrijecimento do pacto colonial de Portugal sobre o Brasil.

PRINCIPAIS REVOLTAS NATIVISTAS

Aclamação de Amador Bueno, em São Paulo, 1641

A notícia da Restauração do trono português, em 1640, provocou um estado de tensão na vila de São Paulo de Piratininga. Ali, durante a União Ibérica, houve forte autonomia municipal, agora ameaçada pelo receio de perseguições políticas por parte de Portugal. Os espanhóis da região também ficaram temerosos, pois, há muito, faziam contrabando com a região do Prata. Somam-se a isso os conflitos entre bandeirantes e jesuítas, que culminaram com a Botada dos Padres Fora.
                                               ( Aclamação de Amador Bueno, obra de Oscar Pereira da Silva, de 1931)

Duas famílias representavam dois grupos políticos na vila: a família Garcia Pires, portuguesa, e a família Camargo, espanhola. Com o fim da União Ibérica, os espanhóis de São Paulo tentaram manter a vila ligada à Espanha. Ao aclamarem Amador Bueno da Ribeira “Rei de São Paulo”, este se recusou e proclamou fidelidade ao novo Rei de Portugal, D. João IV.

Insurreição Pernambucana, 1645 a 1654

Embora nem todos os estudiosos admitam, a Insurreição Pernambucana é vista como importante movimento para a construção do “nativismo” no Nordeste brasileiro, surgido na conjuntura da invasão holandesa.
A resistência contra os invasores provocou grave crise na economia açucareira, com engenhos destruídos, canaviais incendiados e fuga de escravos. A acomodação de interesses entre invasores e senhores de engenho ocorreu quando, através de Maurício de Nassau, a Companhia das Índias Ocidentais, holandesa, passou a financiar a reconstrução dos engenhos e fornecer escravos vindos dos locais também invadidos pela Holanda na África. Quando a Companhia (WIC) adotou a política de confisco, cobrando os empréstimos feitos anteriormente, os senhores de engenho estavam ainda em crise financeira, agravada pela constante fuga de escravos para os quilombos, pela varíola, por incêndios, inundações e secas prolongadas. Era o fim da “acomodação de interesses” e a guerra pela expulsão dos invasores foi retomada.
A assinatura da Trégua dos Dez Anos (1641 a 1651) deixava D. João IV numa situação delicada, pois não podia oficialmente atacar as posições mantidas pelos holandeses. Mas isso não significou que não houvesse um apoio luso, extra-oficialmente. Nos anos iniciais da guerra pela expulsão, portanto, coube aos próprios colonos luso-brasileiros a liderança e a organização da luta. Os líderes da Insurreição Pernambucana foram André Vidal de Negreiros, João Fernandes Vieira, o negro Henrique Dias e o índio Felipe Camarão.
Na Batalha do Monte das Tabocas, em 1645, as forças luso-brasileiras derrotam os holandeses, retomando Alagoas e Sergipe, que se somaram ao Maranhão, já libertado. Na primeira Batalha de Guararapes (abril de 1648), os invasores foram novamente batidos, reduzindo cada vez mais o espaço por eles dominado. No ano seguinte, na segunda Batalha de Guararapes, nova derrota flamenga, desmantelando o controle militar e desestimulando comerciantes holandeses a permanecerem no Brasil.
Em 1651, dois fatos importantes colaboraram para a vitória final em favor dos luso-brasileiros. Em primeiro lugar, houve o fim da trégua assinada dez anos antes, liberando a ação militar de Portugal para defender sua colônia. Em segundo lugar, o Ato de Navegação, promulgado por Oliver Cromwell durante a Revolução Puritana, provocou a guerra entre a Inglaterra e a Holanda, impedindo que esta enviasse tropas para o Brasil.
Em 1653, reforços enviados por Portugal bloquearam Recife por mar, enquanto, por terra, os holandeses eram atacados pelas forças de Barreto de Meneses, João Fernandes Vieira e André Vidal de Negreiros. Em 23 de janeiro de 1654, o comandante holandês entregou-se na Campina da Taborda. Era o fim da invasão holandesa e, ao mesmo tempo, a semente plantada do sentimento nativista, militarmente vitorioso.

OUTRAS REVOLTAS EM PERNAMBUCO
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Revolta de Beckman, no Maranhão, em 1684

As atividades econômicas do Maranhão sempre foram secundárias para Portugal, que priorizava Pernambuco e capitanias vizinhas, as áreas mais ricas do Brasil açucareiro. A fragilidade financeira dos senhores de terra na Maranhão impedia, ou dificultava, a compra de escravos negros para suas lavouras. A solução, frequentemente, era o uso do indígena como escravo. A Companhia de Jesus era contra a escravização do índio, o que provocava constantes conflitos entre os jesuítas e os colonos.
Na tentativa de solucionar o problema, Portugal criou, em 1682, a Companhia de Comércio do Maranhão, que teria o monopólio do comércio de produtos maranhenses por 20 anos e a obrigação de introduzir 10.000 escravos negros, 500 por ano, além do estanco de trigo, azeite, vinho e bacalhau. Porém a Companhia não cumpriu o contratado, cobrando elevados preços pelas mercadorias trazidas e pagando baixos preços pelas mercadorias maranhenses.
Contra tal situação, levantaram-se os colonos, liderados pelos irmãos Beckman. Latifundiários e comerciantes se revoltaram, expulsando os jesuítas e saqueando os armazéns da Companhia. Derrubaram o governador e formaram uma Junta Governativa, composta por seis membros, representantes do clero, dos senhores de terra e do povo. Os rebeldes tentaram apoio do Pará, mas não conseguiram. Tentaram justificar seus motivos ao rei de Portugal, mas seus emissários foram presos.
No ano seguinte, um novo governador, Gomes Freire de Andrade foi enviado ao Maranhão, reprimindo a liderança rebelde, enforcando Manuel Beckman e Jorge Sampaio. Por outro lado, a Companhia de Comércio foi suspensa por dez anos e os colonos poderiam escravizar índios aprisionados em “guerra justa”.

Guerra dos Emboabas, em Minas Gerais, 1708 a 1709

Os paulistas pretendiam a posse exclusiva das minas de ouro das “Gerais”, por eles descobertas. A ausência de órgãos metropolitanos agindo na região tornava difícil o cumprimento da legislação. Os “emboabas”, como eram conhecidos os forasteiros, principalmente os portugueses, receberam, em 1700, autorização para ali permanecerem. Ligavam-se não só à mineração, mas também ao comércio de carnes, fumo, aguardente e artigos de contrabando.
Pequenos incidentes isolados serviram de pretexto para a revolta. Um deles foi o assassinato de um português casado com uma paulista, a quem maltratava. Outro foi a acusação de roubo de uma espingarda de um paulista feita a um português. Outro ainda foi o assassinato de um emboaba por um paulista que, fugindo, asilou-se na casa de seu patrão, depois morto pelos emboabas.
Em 1708, Manuel Nunes Viana, foi proclamado pelos próprios emboabas “Governador das Minas”. Eclodem as lutas, com combates em Sabará e Cachoeira do Campo. Os paulistas deixaram a região de Caetés, indo para o Rio das Mortes. Ali, sob a liderança de Bento do Amaral Coutinho, os emboabas massacraram 300 paulistas, daí derivando o nome do local, “Capão da Traição”.
Em 1709, foi organizada uma nova expedição, com 1.300 paulistas, comandada por Amador Bueno da Veiga. Os emboabas foram cercados no arraial da Ponte do Morro. Antonio de Albuquerque Coelho, governador do Rio de Janeiro, fez a intervenção no caso, impedindo novos derramamentos de sangue. Para Portugal, era fundamental a pacificação da região, o que significaria, como de fato ocorreu, a retomada da produção aurífera.
Como consequências da Guerra dos Emboabas, a capitania de São Paulo e Minas separou-se da capitania do Rio de Janeiro e, em 1711, São Paulo foi elevada da categoria de vila à categoria de cidade. Embora a região em litígio tivesse sido devolvida aos paulistas, estes preferiram deslocar-se mais para Oeste, chegando a Goiás e Mato Grosso.

Revolta de Felipe dos Santos, em Minas Gerais, 1720

Com a pacificação da guerra dos emboabas, a mineração começou a prosperar. A política de Portugal voltou-se para a fiscalização mais rígida, instalando Casas de Fundição em Vila Rica, Sabará, São João d’El Rei e Vila do Príncipe. Assim, ficava proibida a circulação de ouro em pó, pois todo ouro deveria ser transformado em barras. Ali seria cobrado o quinto e as barras seriam timbradas para se tornarem legais.
Na época do governo local do Conde de Assumar, os mineradores e comerciantes de Vila Rica se revoltaram, pretendendo a redução dos impostos, a abolição do monopólio do gado, do fumo, do aguardente e do sal. Eram contra a instalação das Casas de Fundição e contra a obrigatoriedade de pagar impostos baseados no imposto sobre o ouro.
Dois mil revoltosos, sob a liderança de José Peixoto da Silva, dirigiram-se ao palácio de Assumar, no Ribeirão do Carmo. Ardilosamente, Assumar aceitou todas as reivindicações dos rebeldes, para espanto de seus líderes e regozijo das massas, que, não desconfiando dos planos do governador, romperam em aclamações festivas.
Posteriormente, o Conde de Assumar enviou seus soldados contra os insurgentes. A repressão foi violenta, as casas dos rebeldes incendiadas, seus líderes presos, inclusive Felipe dos Santos, o mais popular entre eles. Foi enforcado, seu corpo arrastado pelas ruas de Vila Rica e esquartejado, como “castigo exemplar”.
A Revolta de Vila Rica, como também é conhecido o movimento, conseguiu adiar por cinco anos a instalação da Casa de Fundição. Além disso, a capitania de Minas Gerais separou-se da capitania de São Paulo. Apesar da violência contra os revoltosos, os ideais não foram esquecidos e servirão de base para a Inconfidência Mineira de 1789.